INDO PARA FEIRA DE SANTANA...
Continuação por: Olindina/Cipó/Ribeira do Pombal-BA
O gavião que nos atacava estava aborrecido com alguma coisa. Talvez até tivesse brigado com a namorada e quisesse descontar em nós, pois não víamos qualquer motivo para que nos atacasse. Emitindo fortes trinados, vinha ameaçadoramente para cima de nós com as asas abertas a fim de espantar-nos dali. Então, enquanto o Fernando tratava de espantá-lo movimentando seu boné de cor escura, encaminhei-me rápido até a moto, liguei-a e fui saindo vagarosamente com ela para que o Fernando, andando rápido, sentasse na garupa, o que fez. Assim que sentou, arranquei feroz.
Seguindo adiante e observando novamente a estrada, eis que de repente o Fernando lembra do tombo que a moto tomou na noite anterior, no momento em que eu aguardava seu retorno do casebre de onde nos indicaram a estalagem. Aconteceu que, sentado na moto enquanto esperava que voltasse, falseei o pé, perdi o equilíbrio e com isso, a moto pesada como estava, tombou até ao chão. Como ele já retornava do casebre, ajudou-me levantá-la.
Então agora, diz: Será que a carteira não caiu lá, naquele tombo? Como estava escuro na ocasião, talvez tenha caído e não deu para notarmos na hora.
Mal acabou de falar, acelerei a moto e num instante chegamos ao local. De longe já víamos a carteira gordinha caída na beira da estrada, no início do tal caminho de acesso ao casebre e com várias cabras próximas a ela. Com receio que pudessem comer a carteira, entrei com a moto bem junto a elas fazendo-as correr para longe, assustadas que ficaram com o barulho da descarga.
Ao apanhá-la, intacta, notei ter ao lado dela pegadas de pés descalços e também de sapatos. As pegadas dos sapatos poderiam até ser nossas, mas a de pés descalços não. Pode ser que alguém ao passar por ali, passou e não viu a carteira devido à escuridão da noite. Foi uma tremenda sorte que demos.
De volta à estalagem, já tranquilos e satisfeitos passamos devagar pelo local onde a ave nos assustou. Observando bem as árvores, o Fernando descobriu e mostrou-me haver um ninho exatamente onde estávamos quando ela apareceu. Aí entendemos as razões do ataque que sofremos.
Chegamos na estalagem, pagamos a estadia, apanhamos nossos blusões e partimos animadíssimos para o que desse e viesse.
Nossa saída se deu às 06:20h com a pretensão de alcançarmos a cidade de Paulo Afonso (fica praticamente nas divisas da Bahia, Alagoas e Pernambuco), na estrada Rio Bahia.
Pegamos a estrada BR 110 que não era nada animadora, por ser tal e qual a Rio - Bahia. Buracos e valas por todos os lados, além de muitos cascalhos pelo caminho. Nesse trajeto passamos por Olindina e depois de andarmos durante muito tempo por estrada muito ruim, chegamos à cidadezinha de Cipó, onde num trecho da estrada paramos maravilhados com as águas ferventes que saíam borbulhando do fundo da terra, cujo fenômeno chamam Gêiger.
No local havia uma grande piscina com essa convidativa água quente e limpa. E pelo fato de não haver qualquer pessoa no seu interior ou mesmo por perto, sem perda de tempo tiramos a roupa, e só de cueca (samba-canção) tomamos aquele banho de limpeza que precisávamos. Nadando e boiando durante um bom tempo naquela água muito quente, sentimo-nos relaxados da tensão adquirida na viagem e ao mesmo tempo revigorados para continuarmos na nossa luta do dia a dia.
Que maravilha! O banho foi deveras gostoso e o tempo que ficamos na piscina nos fez muito bem. Fosse ao corpo já cansado e dolorido da viagem, fosse ao espírito que ganhou forte dose de ânimo.
Mas enquanto estávamos na piscina, notamos que em torno dela havia pequenos quartos com banheiras para pessoas que, desejando privacidade no banho, os alugassem. Sabedores disso aproveitamos para nelas trocarmos nossas roupas, tirando as cuecas molhadas.
Mais adiante, moradores da localidade informaram que no meio do ano, gente vinda de fora e até do exterior tem-se banhado naquelas águas na esperança de obter cura contra reumatismo, gota, doença de pele e muitas outras enfermidades. Acho que disseram que serve até para curar falta de dinheiro.
Um detalhe: No município de Cipó existe cruzamento de estradas, acontecendo de uma delas ir para a cidade de Tucano na estrada Rio-Bahia, onde também tem águas termais, segundo informações do pessoal local. Mas como já vimos esse fenômeno aqui mesmo, iremos direto para Jeremoabo.
Pegamos novamente a estrada, parando mais adiante na cidade Ribeira do Pombal por volta das 11:30h, onde resolvemos almoçar.
Esse trecho da estrada pela qual transitamos eu diria que não é ruim não porque essa expressão seria até um elogio. Abominável seria a mais adequada, tendo em vista que os cascalhos com tamanhos variados e espalhados em toda a sua largura e extensão, são terríveis. Eles prejudicam terrivelmente a dirigibilidade, fazendo com que a moto derrape por qualquer bobeira da minha parte.
Após uma parada para o almoço, continuamos por essa estrada perigosíssima. Na tentativa de evitar qualquer acidente, andava devagar e com muita cautela. Razão de até carroças puxadas por jegues, iguais às muitas que existem pela região, me ultrapassavam fazendo com que comêssemos poeira.
Acreditou? Ainda bem que não, pois é brincadeira!.
Passamos por uma cidadezinha de nome Cícero Dantas e depois de penar bastante nesse caminho, finalmente chegamos de volta são e salvos na Rio-Bahia. E às 17:00h, entramos em Jeremoabo.
Analisando se valia a pena continuar para alcançarmos Paulo Afonso conforme programado, olhei para o céu e vendo estar muito carregado de nuvens, pensei: Não... Daqui a pouco vai escurecer, o céu está cheio de nuvens prenunciando uma noite sem luar, estamos cansados e além de tudo isso a moto não tem farol. É... O melhor será pernoitarmos por aqui mesmo.
Dia 26 de fevereiro. / Jeremoabo-BA / 13º Dia Constatei ser uma cidade de bom tamanho e detentora de vasto comércio, talvez com maior predominância no setor da pecuária. Cheguei a essa conclusão pelo fato de ver muitos vaqueiros circulando já cedo pela cidade, com vários deles usando colete, chapéu de couro e chicotes presos à cintura. E teve um detalhe que achei interessante porque, ao invés de botas, usavam sandálias com tiras de couro.
Parei, tomei cafezinho numa padaria que haviam acabado de abrir as portas e depois andei mais um pouco só para exercitar as pernas e massagear a musculatura a fim de compensar o tempo em que fico inerte e curvado sobre a moto.
Retornando ao alojamento encontrei o Fernando já acordado e então tratamos de tomar nosso café da manhã. Pegamos a moto, agradecemos a gentileza por terem deixado que ela ficasse conosco à noite, e estando tudo pronto nos despedimos do pessoal da pousada e partimos em direção à Paulo Afonso com a expectativa de almoçarmos assim que lá chegarmos.
Embora de terra, a estrada estava aceitável por se encontrar lisa após ter sido nivelada por trator, mas por estar o tempo seco e quente a poeirada era intensa.
Apesar dos pesares não demorou muito e chegamos em Paulo Afonso, pegando então uma outra estrada menor que nos levaria à cidade, só para darmos uma espiada por mera curiosidade.
De volta e já novamente na estrada, ao fazermos a travessia da fronteira Bahia-Pernambuco vimos a represa de Paulo Afonso que é geradora de energia para o nordeste. É uma beleza assistir a revolução das águas quando caem do alto da represa e batem mais abaixo, no rio, o famoso São Francisco apelidado de “velho Chico”, onde nas proximidades se encontram as divisas dos estados: Bahia; Pernambuco; Alagoas.
Continuando e já em direção à Pernambuco entramos numa longa ponte de ferro construída sobre o rio São Francisco, com o objetivo de atravessamos para território Pernambucano através dela. Ao chegarmos na sua metade demos uma parada, porque queríamos jogar alguma coisa no rio a fim de termos idéia da altura da ponte até ao leito. Ao saltarmos da mota para irmos ao parapeito sentimos a ponte balançando tanto, que até nos assustou por parecer
Grande abraço
João Cruz